sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Controle de Pragas em Hospitais



O conhecimento popular dita que é inerente a determinadas espécies biológicas serem pragas, contudo, este juízo não é válido. O conceito de praga dita que “é qualquer organismo vivo que cause algum prejuízo ao homem quando ambos compartilham o mesmo ambiente”.

O controle de pragas em um ambiente hospitalar não é uma tarefa fácil, uma vez que se trata de um lugar que está em constante atividade, faz uso diversos recursos que não podem ser contaminados ou danificados no processo de eliminação das infestações, além da presença dos pacientes, muitas vezes extremamente fragilizados e, portanto, mais propensos a contrair algum tipo de infecção.

É importante, antes de se começar a discutir as infestações, fazer uma diferenciação entre uma ocorrência episódica e uma infestação de pragas propriamente dita.

A primeira se dá quando a praga encontra facilidade de acesso e entra no ambiente, mas não encontra condições propícias para o seu desenvolvimento e acaba morrendo ou simplesmente abandonando o ambiente. Já numa infestação, a praga tem acesso às áreas e ali encontram condições adequadas para se desenvolver; essas são as condições necessárias à sobrevivência de todo e qualquer organismo vivo: alimento, água e abrigo. Baseado nisso, vale também ressaltar que qualquer relação feita entre a espécie da praga e o ambiente específico que infesta é falsa. É errado dizer, por exemplo, que ambientes onde há o acúmulo de lixo e outros tipos de descartes são infestados somente por baratas.

Qualquer praga tem possibilidade de infestar qualquer ambiente que lhe forneça as condições ótimas para a sua sobrevivência. É correto dizer, portanto, que as pragas são oportunistas e sua instalação em um ambiente, qualquer que seja, está ligada somente à necessidade biológica de sobrevivência e perpetuação de sua espécie.

Definidos estes pontos vamos, daqui em diante, tratar somente das infestações de pragas, aquelas que necessitam ser diagnosticadas e propriamente contidas.

As pragas que infestam hospitais são as mesmas que ocorrem em outros edifícios. São elas: baratas, ratos, formigas, moscas, pulgas e afins; sendo que o principal problema da presença desses animais em um espaço clínico reside no fato de que são agentes disseminadores mecânicos e/ou biológicos de doenças infectocontagiosas causadas por protozoários, vírus, bactérias e outros microrganismos, além de prejudicarem as condições de esterilização de equipamentos e ambientes.

É possível que uma formiga passe por um local onde existem materiais utilizados em curativos e, em seguida, adentre uma sala esterilizada, podendo colocar o procedimento em risco. Também , a presença desses animais em ambiente hospitalar pode vir a comprometer a imagem da instituição, uma vez que é de domínio público o conceito de que um local designado para o tratamento de enfermos deve ser devidamente higienizado.

Ainda que o maior problema com pragas seja a questão da contaminação e tudo o que isto acarreta, vale destacar que há a possibilidade de insetos se infiltrarem nas instalações elétricas e causar danos aos equipamentos, ou até mesmo um curto-circuito.

É necessária atenção, uma vez que a maioria dos equipamentos de hospitais e clínicas é alimentada por fontes de energia elétrica.

A incidência de pragas depende não somente da higiene e limpeza do local, mas também da sua localização e manutenção. Um hospital localizado, por exemplo, às margens de um rio no qual é frequentemente despejado esgoto, ou ainda próximo a instalações industriais, pode ter uma higienização adequada em suas instalações, entretanto, se seus vizinhos não necessariamente seguirem os mesmos princípios, acabam por ocasionar a migração de ratos, baratas e semelhantes de uma instalação para a outra; ou seja, os bons cuidados dentro do hospital não impedem que as pragas de outros ambientes venham habitar o local.

Seja a infestação de origem interna ou externa ao ambiente hospitalar, para que o problema possa ser diagnosticado e devidamente controlado, a sugestão  é que todo o estabelecimento seja monitorado periodicamente, sendo que as estratégias de controle devem ser aplicadas de acordo com o local e com o tipo de infestação observada. No entanto ainda que a origem da infestação seja principalmente externa, as medidas de higiene dentro das instalações clínicas ajudam a minimizar o problema.

É válido ressaltar que os trabalhadores do estabelecimento são treinados para que possam reconhecer uma infestação (ou o início de uma), visto que a melhor maneira de se perceber a aglomeração de insetos e afins ainda é de forma visual.

É importante,portanto, que grandes hospitais possuam uma equipe diferenciada designada para essa função. Diariamente, é importante que haja no hospital um controlador de pragas treinado e orientado para exercer as ações preventivas.

Atualmente, a abordagem mais moderna para o controle de pragas em instituições de saúde é o Controle Integrado de Pragas. Trata-se de uma abordagem fundamentada na gestão das ocorrências com pragas e seu uso como indicadores ambientais. Pode-se avaliar a qualidade das instalações baseado nas infestações presentes (ou ausentes).

A cada ocorrência deve-se buscar entender as relações ecológicas entre as características biológicas da praga e os fatores ambientais oferecidos no local da infestação.

 Para isso, os hábitos e os ciclos de vida de muitas pragas devem ser compreendidos e as medidas apropriadas para a resolução destes problemas devem ser implementadas. Quando uma população de pragas já está estabelecida, o objetivo mais comum dos programas de controle adotados é a eliminação desta população. Porém, esta atividade só terá sucesso se as condições iniciais que permitiram a ocorrência da infestação sejam eliminadas ou o acesso destas seja completamente bloqueado.”.

Pode-se entender esse processo como o diagnóstico do problema. A partir deste diagnóstico, as medidas preventivas e/ou corretivas são corretamente tomadas.

Os hospitais devem estabelecer medidas de controle em pontos críticos, mais propensos à permissão da entrada de pragas, tais como:

- entrada e armazenamento dos materiais – sejam eles alimentícios ou não;

- práticas de alimentação inadequadas, com geração de resíduos mal acondicionados e em vários locais do hospital;

- destinação, transporte e acondicionamento, inadequados de resíduos;

- entrada de rouparia e outros materiais ou equipamentos;

- armazenamento e coleta adequados de resíduos;

- manutenção do local como vedação dos forros, telhados, frestas, interruptores, etc.;

- janelas e portas sem a devida proteção ou permanentemente abertas;

- presença de goteiras, infiltrações, águas empoçadas, além de tubulação de águas pluviais e bueiros mal conservados;

- má conservação ou manutenção de ralos permanentemente abertos.

O controle integrado visa, fundamentalmente, minimizar a utilização de agentes químicos durante as medidas corretivas. No estágio atual esta abordagem permite, quando devidamente aplicada à redução, uma média de até 85% nos volumes de inseticidas aplicados e mais de 95% no volume de raticidas, quando comparada às técnicas tradicionais. Essa redução é especialmente importante quando se trata de uma instituição de saúde uma vez que, é um local onde há alta concentração de paciente com a saúde extremamente debilitada, além de um número bastante considerável de idosos e crianças – que são o principal público dessas instituições – e é um fato cientificamente conhecido que são mais sensíveis aos efeitos de diversos produtos químicos.

Quando se faz necessária a utilização de produtos químicos, a seleção daqueles que serão utilizados deve ser muito criteriosa. É conhecido que na composição de produtos utilizados no combate a infestações são utilizados entre trinta e quarenta compostos ativos e, dentre estes ingredientes, existem produtos que são reconhecidos como altamente tóxicos, suspeitos de serem cancerígenos, podendo afetar negativamente a reprodução e o desenvolvimento do feto, e de interferirem no funcionamento do sistema endócrino, que faz o controle hormonal do corpo.

O uso de produtos químicos é evitado, além do cuidado para com os pacientes presentes no hospital, pelo fato de que, mesmo não intencionalmente, os pesticidas acabam por erradicar somente os indivíduos menos resistentes, e isso acaba por realizar uma “seleção”.

Devemos perceber que a seleção dos indivíduos mais fortes e mais resistentes presentes na infestação não serão atingidos, mas podem vir a se reinfestar, com um aumento desordenado da população de pragas com indivíduos resistentes aos pesticidas. Pode-se afirmar que o início do tratamento com pesticidas, raticidas e afins pode ser adiado e evitado para que não se acabe criando um círculo vicioso absolutamente incorreto e arriscado para a saúde no ambiente clínico, pois a seleção de indivíduos mais resistentes ao primeiro pesticida iria demandar a aplicação de um produto mais forte para a realização do controle e, na utilização deste, uma nova seleção de pragas seria realizada e assim sucessivamente.

Quando se faz inevitável a utilização de recursos químicos, o controle de pragas e microrganismos em hospitais é feito por empresas terceirizadas e especializadas e deve seguir as normas estabelecidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). De acordo com a ANVISA, é de responsabilidade da empresa contratada garantir o mínimo impacto ambiental, a preservação da boa saúde do cliente e do encarregado da aplicação dos produtos. Os produtos utilizados devem ser todos cadastrados na ANVISA e sua manipulação e descarte também é de responsabilidade da empresa contratada.

Apesar da preferência por tratamentos não químicos, é por vezes recomendado que haja uma desinsetização de rotina. Quanto à periodicidade das desinsetizações rotineiras, o ideal é que exista um histórico de informações sobre o local e as ocorrências de pragas.

Cabe ao profissional técnico responsável estabelecer o número de visitas e aplicações de acordo com o que for considerado melhor para o estabelecimento e o cliente. Geralmente, a periodicidade de visitas está diretamente relacionada ao porte do estabelecimento (número de leitos) e à localização do hospital. As visitas podem ser semanais, quinzenais ou mensais.

Tendo em vista que determinadas áreas são mais propensas a desenvolverem uma infestação em relação a outras, há uma periodicidade recomendada para melhor eficiência na identificação e controle dos insetos.

É importante, contudo, lembrar que estas são sugestões. São elas:

- mensalmente, áreas críticas como cozinhas, copas, despensas e redes de esgoto devem ser desinsetizadas;

- a cada dois meses, áreas de cuidados com os pacientes como enfermarias, apartamentos, centros cirúrgicos, CTIs, UTIs, pronto-socorros e consultórios médicos devem ser inspecionados, sendo recomendado pela vigilância sanitária que haja desinsetização ao menos uma vez ao ano;

- os setores administrativos devem passar por inspeção a cada três meses.

O controle citado acima é, na maioria das vezes, realizado com os materiais menos agressivos possíveis, como géis baraticidas e formicidas, ratoeiras, entre outros. Se por alguma eventualidade for necessário um controle químico mais eficiente no ambiente hospitalar, certas medidas devem ser tomadas visando garantir a segurança de todas as pessoas envolvidas ativa ou passivamente no processo, tais como:

- ações de controle químico devem ser de conhecimento da Diretoria Administrativa, que, por sua vez, informará aos setores os horários e locais que serão desinsetizados ou desratizados;

- qualquer ação de controle químico deve estar respaldada em normas e rotinas técnicas, inclusive consultando a Gerência de Controle de Zoonose em caso de dúvidas;



Alan George Calvet da Silva,Professor e Biólogo com experiência em saúde pública.
crbio: 107.266/05-D

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